quarta-feira, 22 de abril de 2009

 

Honestidade Intelectual



Leio no «Expresso» um artigo em que Jónatas Machado, professor de direito constitucional da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, defende que «não houve abuso no tratamento jornalístico dado ao “Caso Freeport”», obviamente no que se refere à pessoa do Primeiro-ministro.

Afirma Jónatas Machado que «a liberdade de expressão existe precisamente para proteger quem diz mal, quem critica e quem denuncia» e também que «a especulação jornalística é parte da liberdade de expressão».
E tudo isto é perfeitamente verdade!

De facto, é muito curioso como de duas ou três afirmações panfletárias com que toda a gente está de acordo, se pode depois formular uma teoria absolutamente abstrusa.

Pois, pelo que Jónatas Machado defende, é clara a sua posição, tão comum a tantas pessoas, muitas delas até jornalistas de referência:
Das parangonas facciosas de alguns jornais, fazem na praça pública um julgamento sobre uma determinada pessoa e, depois de o “transitar em julgado”, formatam todos os seus pensamentos e opiniões a partir desse autêntico assassínio de carácter, sem que o visado tenha qualquer possibilidade de se defender.

Cheguei até a ver a inequívoca lucidez de Mário Crespo indignar-se com o facto de o Primeiro-ministro «não ter ainda sido constituído arguido» no “Processo Freeport”, sem sequer curar de saber que um arguido não é necessariamente um acusado e, principalmente, esquecendo-se que tanto o Ministério Público como a Polícia Judiciária anunciaram formalmente que José Sócrates nem sequer suspeito era no processo.

O que é pena é que tantas opiniões se deformem à volta de divergências políticas e até de ódios pessoais, e não consigam um distanciamento objectivo para a formulação de Princípios que, afinal, são fundamentais à liberdade de Expressão e, por isso, também ao Estado de Direito e à própria Democracia.

Exemplo disso é acabarmos a saber que Jónatas Machado, afinal um professor de direito constitucional, é da opinião que em nome da liberdade de expressão deverão imediatamente ceder todos os restantes valores constitucionais como a honra, a reputação e o bom nome dos cidadãos.

Repare-se que Jónatas Machado não está a defender que a liberdade de expressão, agora no sentido da denúncia ou do relato jornalístico de um facto ou de um acontecimento, é mais importante do que a honra de uma pessoa.
Isso, como é óbvio, todas as pessoas no seu juízo perfeito defendem!

Pelo contrário, Jónatas Machado acha que essa honra nada vale se estiver em confronto – vejam só! – até com a própria «especulação jornalística», por muito que ela careça de substância ou por mais infundamentada que seja!

Vai daí, o raciocínio seguinte é mais do que lógico:
- O Primeiro-ministro José Sócrates está a agir de forma ilegítima quando demanda judicialmente quem denigre o seu bom nome, a sua honra e a sua reputação, mesmo que o acusado o tenha feito recorrendo a esse novo direito constitucional que é… a especulação jornalística.

Porque um processo judicial, o recurso a um órgão de soberania como é um Tribunal, de repente já não é um direito de quem se sente difamado ou injuriado: é agora uma ignóbil pressão sobre os jornalistas e um autêntico atentado à liberdade de expressão, na sua forma mais pura que é, pelos vistos, a «especulação jornalística».

Mas mais:
Para Jónatas Machado a consubstanciação técnico-constitucional para este brilhante raciocínio residiria até na formulação de um «princípio de imunidade» dos jornalistas, tal como acontece com os deputados.
A tortuosidade do raciocínio não carece de demonstração. Talvez se explique pelo simples facto de Jónatas Machado ser um conhecido criacionista, que ensina nas suas aulas da Faculdade de Direito que o mundo foi criado há 6 mil anos, e que Deus espalhou os fósseis pela Terra somente para testar a nossa fé.

Também não é necessário fazer aqui «especulações bloguísticas» que atinjam o bom nome, a honra e a reputação de Jónatas Machado – ou de pessoas que pensem como ele – só para lhe dar a provar do seu próprio remédio e ver aquilo que é bom.

Nem sequer vale a pena falar no repugnante aproveitamento político-partidário que toda esta ignomínia tem merecido.
Ou na imbecilidade de quem, só por ser «acusador», se julga de repente um audaz protagonista de um novo «Watergate».

Mas leio no «Diário de Notícias» que um escritório de advogados inglês estudou a fundo o «caso Freeport» e, depois de seguir o rasto de todos os dinheiros envolvidos, chegou à conclusão que nada, mas absolutamente nada, aponta para qualquer forma de responsabilização do Primeiro-ministro José Sócrates.

O que é lamentável, é que todos aqueles que têm especulado sobre a honra e a honestidade do Primeiro-ministro de Portugal, e persistentemente arrastam o seu nome pela lama, não tenham agora a dignidade e a mais básica honestidade intelectual, se não para valorarem suficientemente esta notícia, ao menos para sobre ela fazerem um pouco de… «especulação jornalística»!




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