quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

 

Um modelo de harmonia



Durante a audiência geral de ontem no Vaticano, o Papa Bento XVI falou sobre a relação entre a Fé e a Razão e, a esse propósito, apresentou a figura de Santo Agostinho como «um modelo de harmonia num percurso intelectual e espiritual».

Não vou falar agora dessa espécie de complexo de inferioridade que parece ser transversal a todos os teístas, deístas e quejandos, quando persistem nesse completo e ridículo absurdo da procura de uma explicação racional para a sua fé.
Nunca percebi porque é que as pessoas de fé, se se orgulham dela (vá lá o Diabo entender isso), não a afirmam de peito aberto e não assumem também com orgulho a sua irracionalidade.

Vou antes tentar perceber quem era esse tal de Santo Agostinho que o Papa BentoXVI considera «um modelo de harmonia num percurso intelectual e espiritual».
Encontrado e definido esse modelo, talvez possamos compreender e conhecer melhor o próprio Papa.

Pois bem:
Santo Agostinho, ou Agostinho de Hipona, viveu entre os anos 354 e 430.
Foi canonizado e é considerado um «doutor da Igreja».

Talvez o que mais tenha distinguido Santo Agostinho, tendo em vista principalmente o tempo em que viveu, foi a defesa de que as Escrituras deviam ser lidas e interpretadas de acordo com o conhecimento e o modo de pensar de cada época, e que a fé cristã se deveria interligar com o estudo da natureza.
Tinha, de facto, uma visão bastante pragmática da teologia (passe a expressão), sem contudo abandonar os costumeiros fundamentalismos da fé, como o pecado original e que as crianças que morriam sem baptismo estavam condenadas eternamente ao Inferno, ou uma fanática e obstinada defesa da Trindade.

Por aqui já podemos começar a ter uma primeira imagem de quem foi este «modelo de harmonia» do Papa Bento XVI.

Mas Santo Agostinho defendeu também que a Igreja Católica deveria usar de toda a força e métodos que fossem necessários para eliminar «os seus filhos perdidos» antes que estes conduzissem outros à sua própria destruição.
Exemplo disso foi a promoção e defesa acérrima da perseguição e do sangrento massacre dos «donatistas», em brilhantes escritos que ao longo da História da Igreja foram profusamente utilizados como explicação e fundamentação «racionalista» para as perseguições religiosas e para a própria Inquisição.
Foi precisamente nesse mesmo sentido que Santo Agostinho defendeu o conceito de «Guerra Santa» e de «Guerra Santa Preventiva», o que uma vez mais veio a servir de fundamentação filosófica – e “racionalista”, como é bom de ver – para os incontáveis massacres perpetrados pela Igreja ao longo dos séculos.

Santo Agostinho defendeu ainda a perseguição, a morte e a dispersão dos judeus pelo mundo, a quem culpava, como a Bíblia também o faz, pela morte de Jesus Cristo.

Defendia o celibato do clero mas, pesar de ter chegado a ser ordenado bispo, chegou a ter duas mulheres simultaneamente.
A sua primeira mulher teve der ser sua concubina por dois anos antes de se poderem casar, pois não tinha ainda idade suficiente para contrair matrimónio, que na ocasião era aos doze anos.

Como qualquer bom católico considerava a mulher um ser inferior e incapaz de raciocinar de forma coerente, impuro, pecaminoso e até desprovido de alma.
E como qualquer bom fundamentalista católico Santo Agostinho era também um conhecido tarado sexual.

Apesar de pertencer ao clero, de ter duas mulheres simultaneamente e de lhe serem conhecidos incontáveis devaneios extra-conjugais, considerava o sexo e «os prazeres da carne» como os piores e mais abjectos de todos os pecados.

Foi talvez nessa brilhante e incessante busca da conciliação ente a religião, o mundo prático da natureza e o racionalismo, e que fez dele «doutor da Igreja», que Santo Agostinho proferiu uma das suas mais célebres proclamações e solicitações ao mitológico Altíssimo dos católicos, o que antes de mais provou que bem podia ser um mitómano fanático, um típico misógino e tarado sexual, um impiedoso defensor de «guerras santas» e do extermínio e dos massacres dos fiéis das religiões rivais, mas que, ao mesmo tempo, não era nada parvo:
- «Senhor, concede-me a continência e a castidade... mas por enquanto ainda não!»


Em suma:
Podemos agora perceber com mais exactidão quem é e o que defende filosoficamente este Ratzinger, mais conhecido por Papa Bento XVI, agora através do percurso, dos ensinamentos e da personalidade de um homem a quem acabou de considerar como «um modelo de harmonia num percurso intelectual e espiritual».

Católicos de todo o mundo: orgulhai-vos!




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