segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

 

Do Fanatismo à Imbecilidade



Na sua homilia semanal, o Abominável César das Neves volta ao ataque no «Diário de Notícias» de hoje, desta vez com um artigo que intitula “Como a Igreja Criou a Europa”.

O artigo é tão assombrosamente asinino e as alarvidades que contém são tão de tal forma ridículas, que para ficarmos com uma ideia basta citar estas singelas passagens:

«...a Igreja Católica, vencendo o paganismo obscurantista e civilizando os bárbaros, foi uma poderosa força dinâmica, estabelecendo os valores de tolerância, caridade e progresso que criaram a sociedade contemporânea.
«A Idade Média, conhecida como "Idade das Trevas", foi uma das épocas de maior desenvolvimento e criatividade técnica, artística e institucional da História».

Como se não bastasse, este manso e simples candidato ao Reino dos Céus ainda nos mimoseia com a afirmação de que devemos à a Igreja Católica o lançamento «das bases da ciência, a separação Igreja-Estado e a liberdade dos escravos».

Quem diz isto não pode ser só ignorante!
Quem diz isto não pode ser só um simples e pobre fanático, com os sentidos e o intelecto já completamente embotados por delírios místicos e religiosos.
Quem diz isto é muito mais do que uma abécula, mais do que um qualquer coitado pobre de espírito digno não mais do que de piedade e de muita, mas muita comiseração.

De facto, creditar à Igreja Católica ter trazido à História da Humanidade valores como a tolerância e o progresso, atribuir-lhe a responsabilidade pelo lançamento das bases da ciência, do fim da escravatura e até a separação da Igreja e do Estado, já não é simples estupidez ou mera ignorância.

Porque proferir estes dislates toca já as raias de uma incomensurável imbecilidade.

Só assim se explica que alguém possa ter a coragem e o autêntico arrojo de tentar fazer passar por parvos todos os leitores de um jornal e fazer de conta que ninguém nunca ouviu falar, por exemplo, no «Index Librorum Prohibitorum» ou a lista dos livros considerados perigosos ou “perniciosos” e que eram proibidos pela Igreja Católica Apostólica Romana – lista que ainda hoje existe(!) – entre os quais se contam os livros de Galileu Copérnico, Maquiavel, Erasmo, Espinosa, Locke, Berkeley, Diderot, Voltaire, Pascal, Hobbes, Descartes, Rousseau Montesquieu, Hume, Kant, Milton, Vítor Hugo, Zola, Stendhal, Flaubert, Balzac, Sartre, etc., etc.

Como pode alguém creditar uma organização simplesmente tenebrosa de ser «tolerante» e «caridosa» quando essa mesma organização é responsável pelo indizível sofrimento de milhares e milhares de pessoas ao longo de vários séculos, e não só sob a responsabilidade dessa autêntica associação de malfeitores (cujos responsáveis estão hoje todos canonizados), que dava pelo nome de Santa Inquisição – e que ainda hoje existe, embora sob o romântico nome de «Congregação Para a Doutrina da Fé» - e que ainda no ano de 1826 detinha poder suficiente para imolar pelo fogo alguém simplesmente acusado de “deísmo”?

Como pode alguém dizer que a Igreja Católica lançou as bases da Ciência enquanto queimou Giordano Bruno numa fogueira (não sem antes lhe ter pregado a língua a uma tábua «para o fazer parar de blasfemar») e ia fazendo o mesmo a Galileu?

Como pode alguém ter coragem de elogiar a Igreja Católica pelos seus elevados valores de tolerância e até mesmo por ter abolido a escravatura, quando se conhecem os massacres dos Cátaros, de centenas de milhar de judeus ou de “hereges”, ou os sucessivos massacres de populações inteiras perpetrados por ordas fanáticas organizadas sob o nome de «Cruzadas»?

Como pode alguém afirmar como época de grande desenvolvimento e criatividade institucional da História, precisamente a época em que viveu – e prevaleceu – Tomás de Torquemada?

Como pode alguém apodar de «poderosa força dinâmica» a mesma quadrilha organizada que tem contribuído para o atraso endémico de tantas sociedades, que sempre se tem aliado a ditadores sanguinários e que há já dois milénios tenta incutir aos Homens os mesmos valores de xenofobia, de homofobia, de misoginia, de racismo, de intolerância e de discriminação e, como se não bastasse, os mesmos preconceitos e abjectas taras sexuais de que, pelos vistos, os seus fiéis parecem invariavelmente padecer?


Mas, se virmos bem, talvez o mais triste disto tudo não esteja no pobre coitado do João César das Neves e nas imbecilidades que o «Diário de Notícias» o deixa escrever todas as semanas.

O que é profundamente triste é pensar na quantidade imensa de pessoas que, reféns do mesmo estúpido e cretino fanatismo, sofrem dos mesmos e precisos delírios e, lá no fundo,... pensam exactamente como ele...




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