quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

 

A «EasyJet» ou como no "low cost" é que está o ganho



«Companhia de aviação associa-se a causa 'gay'» é o título do artigo de Fernanda Câncio publicado no «Diário de Notícias» de hoje:

«Uma companhia especializada em voos low cost resolveu, num gesto inédito em Portugal, promover-se através da associação à causa do casamento das pessoas do mesmo sexo.
Para tal, convidaram o casal Teresa Pires e Helena Paixão, cuja pretensão de casamento civil está em apreciação no Tribunal Constitucional, para "celebrarem a bordo um compromisso homossexual".

O voo em causa, que parte hoje do aeroporto da Portela, tem como destino a capital da Espanha, país que em 2005 legalizou a união civil de pessoas do mesmo sexo, pelo que o anúncio do evento, feito por uma agência de comunicação, leva a crer que o "compromisso" em causa é um casamento.
Na verdade, trata-se, como as próprias Teresa e Helena certificaram ao DN, de "uma celebração da união de facto".
Certo é que a união de facto entre pessoas do mesmo sexo está legalmente reconhecida em Portugal desde 2001, pelo que "a celebração de compromisso" que o press release da agência de comunicação anuncia nada tem de novo ou de extraordinário - a não ser o facto, nunca antes verificado no País, de uma empresa usar a luta pelos direitos dos homossexuais para buscar visibilidade mediática.

As duas mulheres, que em Fevereiro de 2006 tentaram casar numa conservatória de Lisboa, recusaram esclarecer se vão receber alguma compensação monetária, ou em espécie, pela sua colaboração neste evento de marketing, adiando quaisquer outras declarações para conferência de imprensa convocada, pela mesma agência de comunicação, para as 13.20h de hoje, na pista do aeroporto.
A convocatória de imprensa, enviada às redacções na segunda-feira, impunha inclusivamente um "embargo" noticioso "até dia 19", pelo que não foi possível obter esclarecimentos da própria companhia aérea (a EasyJet) ou de Jordi Petit, um activista espanhol do movimento LGBT que estará também presente na conferência de imprensa. "As declarações serão na conferência", disse Jordi ao DN.

Ainda assim, o DN conseguiu saber, junto da agência de comunicação (a Tinkle) que organizou o "acontecimento", que foram oferecidos a Teresa e Helena (assim como, presume-se, para as respectivas filhas, já que o press release menciona a presença das crianças na "celebração") os voos de ida e volta assim como dois dias de estada em Espanha.
Quanto à ideia do evento, surgiu, segundo a Tinkle, na sequência de um contacto das duas mulheres com a companhia de aviação, solicitando a realização da tal "celebração" a bordo.

Esta afirmação é, no entanto, contraditada por um activista de uma associação LGBT portuguesa, que disse ao DN que a respectiva associação foi contactada por alguém que em nome da EasyJet solicitou contactos de casais homossexuais que quisessem "participar" num evento deste género. A associação não deu resposta à solicitação, mas a agência acabaria por conseguir chegar à fala com Teresa e Helena, contactando o advogado que as representa na sua intenção de casar.

Luís Grave Rodrigues diz ter recebido um telefonema "de uma agência de comunicação" propondo o "acontecimento" há semanas, "no auge da controvérsia sobre o anúncio da cerveja Tagus" (anúncio que foi acusado de ser homofóbico por várias associações, tendo sido retirado).
Grave Rodrigues deu o contacto das duas mulheres mas diz tê-las desaconselhado de aceitar a proposta.

O evento de hoje, que o professor de jornalismo e ex-provedor do leitor do DN Mário Mesquita vê como aquilo a que se dá o nome de "pseudo-acontecimento" surge-lhe revelador, até pela imposição de um "embargo", como uma "técnica de marketing nova", que utiliza um assunto "que por ser controverso tem um valor acrescentado do ponto de vista da atenção do público"».

*

Entretanto, na mesma edição de hoje do «Diário de Notícias» um artigo com o título «Petição contra homofobia gera polémica na Assembleia» dá-nos conta que uma petição internacional que sugere a criação de um «Dia Mundial de Luta Contra a Homofobia» mereceu na Comissão Parlamentar de Ética uma proposta de arquivamento da autoria do deputado monárquico (eleito pelo PSD) Nuno da Câmara Pereira.

Recorreu certamente o fadista à mediocridade dos seus talentos artísticos para fundamentar a sua proposta.
Com efeito, depois de invocar um argumento formal relacionado com o número de assinaturas necessário para a petição, o deputado cançonetista brindou-nos com este brilhante número de circo, dizendo:
- Um «Dia Mundial contra a Homofobia» colocaria os homofóbicos "numa situação de discriminação" e isso significaria de alguma forma, "atentar contra a liberdade de opinião".

Mas este quadrúmano cantor está redondamente enganado. E desafinado.
Porque o que isso significa é uma coisa bem diversa:

Para já, significa que na Assembleia da República, na sede do Poder Legislativo da República Portuguesa, está sentado um sujeito que, enquanto recusa o reconhecimento dos direitos fundamentais (estabelecidos até na própria Constituição que jurou defender) a um grupo de cidadãos portugueses discriminados em razão da sua orientação sexual, defende ao mesmo tempo que não se deve discriminar quem os discrimina, porque isso seria uma coisa que ele não tolera: porque isso, afinal, seria... uma discriminação!

Bem bonito, não é?

Mas o que tudo isso significa também, é que a escolha dos deputados à Assembleia da República há muito que deveria passar, por parte dos partidos (e de todos eles), por um critério bem mais rigoroso.
Porque fazer sentar numa cadeira de um Parlamento um tipo cujas aptidões que lhe são conhecidas são simplesmente cantar o fado – e ainda por cima muito mal, diga-se de passagem – não podia deixar de dar este resultado.

Um resultado tão incomensuravelmente triste, quanto a profunda imbecilidade que revela.




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