segunda-feira, 4 de dezembro de 2006

 

El-Rei Dom Chouriço



O «Correio da Manhã» resolveu citar um cidadão de nome Duarte Pio de Bragança que afirmou:
«A democracia portuguesa não é uma democracia, é uma fraude».

Segundo tão triste Pio, a fraude da democracia portuguesa reside no facto de a Constituição impedir o referendo sobre a natureza do próprio regime, ao mesmo tempo que, disse ele, «condiciona qualquer revisão constitucional ao respeito pela forma republicana de governo».

Este pio cidadão é conhecido por aparecer em revistas de «jet set» onde exibe a mulher e os filhos, e é famoso porque pensa que seria o Chefe de Estado se Portugal fosse uma monarquia.

Pelos vistos, este cidadão que gostava de ser Chefe de Estado (mas que se refere a uma coisa curiosíssima a que chama «forma republicana de governo») deve estar convencido que a Constituição é a única coisa que o impede de estar sentado num trono com uma rodela de metal enfeitada com berloques bem enfiada na cabeça e mandar bitaites sobre aquilo de que nada percebe.

E deve estar convencido que se não fosse o impedimento constitucional, Portugal seria agora uma monarquia.
E então, claro está, a democracia portuguesa já não seria uma fraude.

Claro que o próprio facto de um qualquer cidadão poder debitar livre e impunemente as maiores baboseiras sobre o regime democrático em que vive não tem, para o Pio, qualquer importância para a afirmação de uma democracia.
Nem sequer a própria existência de um partido monárquico legalmente constituído. Provavelmente pelo impacto ridículo, risível e meramente residual que tem no eleitorado.

Mas a democracia portuguesa já não seria uma fraude se o Chefe de Estado – ainda para mais com a importância que tem num regime semi-presidencialista como o nosso – deixasse de ser eleito por voto directo, secreto e universal dos portugueses e passasse a ser um cargo entregue a um «chouriço» qualquer, «legitimado» não se sabe por que raio de linhagem que pretende que lhe dê mais direitos que aos demais cidadãos.

Ou seja, para este monárquico chouriço, que gostava de ser Chefe de Estado e de referendar a democracia portuguesa, esta já não seria uma fraude se o cargo de Chefe de Estado deixasse de poder ser desempenhado por qualquer cidadão, escolhido pelo mérito que os seus concidadãos entenderem reconhecer-lhe em eleições livres, mas passasse a ser desempenhado por mera e simples nomeação de uma única pessoa, cuja legitimidade para o exercício desse cargo proviria unicamente do seu nascimento.

A democracia portuguesa já não seria uma fraude se o cargo de Chefe de Estado fosse de nomeação vitalícia, mesmo que o ilustre herdeiro designado se viesse a revelar um reaccionário imbecil, retrógrado e enfeudado a uma religião, ou fosse, enfim, uma besta qualquer que o povo tivesse de aturar (como tantas vezes já sucedeu) para o resto da sua vida.

E então, a democracia portuguesa já não seria uma fraude se à volta do Chefe de Estado passasse a rodopiar uma clique de fadistas marialvas vestidos de coletes verde-tropa, deslocando-se de preferência num verdejante Range-Rover a caminho de sucessivas touradas, e arrogando-se títulos nobiliárquicos e superioridades dinásticas de grandes senhores feudais da idade média, de quem herdaram não mais do que o atraso mental.

Mas descansemos:
Porque decerto convencida de que ser «adepto da Coroa» é sinónimo de uma qualquer e misteriosa superioridade intelectual, há por aí muito boa gente que, provavelmente porque não olhou bem para ele ou ainda não o ouviu abrir a boca, não se apercebeu ainda que o principal adversário da «causa monárquica» em Portugal é precisamente esta peculiar personagem que dá pelo nome de Duarte Pio de Bragança.




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